sexta-feira, 29 de junho de 2012


A representação das vontades: aqui.

           Há tanta gente por aí. Uma menina cresce acreditando  que as nuvens são mágicas, até, na escola, barrarem a imaginação, como se a linguagem não fosse arte. A linguagem é amor: as imagens, as mãos, os livros evitam mortos de gravata, de vestido. Renascer pressupõe um rasgo, uma seringa direto na ferida no peito. Se eu morrer agora quando do amor eu dei? Estou cheia de amor, poderia criar 5 filhos, casar , ter amantes e talvez não tivesse tanto amor, se minhas mãos soubessem esculpir uma pedra,transformar  uma madeira em símbolo, em centro. As palavras não são justas e minhas mãos confundem as pessoas queridas. Correnteza  em olhar, construo uma casa e faço amor com meus sonhos. O  ponto de equilíbrio é a graça da luz, da  vida entre um terminal de ônibus e uma fila de gente, uns pensamentos soltos, pessoas vão aos poucos sendo pessoas. Qual o melhor olhar para saber delas? Construtores de rotina, cansaço de roupas que se repetem, ou ainda, homens e mulheres cheios de força e luz nadando contra a opressão de suas próprias escolhas, do vínculo com a instituição, do verbo rasgado da igreja, da família vestindo os que insistem em ser nus, a lágrima da última despedida quase amputando os braços. Mas os braços, os dentes, as veias com sangue espesso, a vida insiste cheia de flor a cada pessoa bonita que sorrir, a cada afeto gratuito, a lua tira sarro  de qualquer tragédia, ela acelera meu ritmo , me põe em transe.
      Qual o gosto do seu sorriso largo? Quando foi mesmo que vi?
            Eu não tenho medo de morrer, mas a vida às vezes me assusta, vejo gente presa em cruz, em grade, em preço. Dá medo de saber desse itinerário, meus nervos pulam.
     A ideia reguladora de tantos é uma  tenda de opressão e medo, não quero TER, TER. O que  é mesmo TER alguém? Se eu só sentisse seu corpo, seu pulso, gosto e resposta a minha vontade, uma comunhão limpa, sem medir forças, sem vaidades? Se eu derramasse amor nas suas estrelas e flor no seu perfume?  Acalmasse essas interrogações vãs que eu engulo com café com leite e pão com manteiga. Não lhe peço nem verbo, nem espera, peço comunhão em sim, em  mãos em comum carinho.
        Eu não sei dizer disso,  tenho umas coisas se derramando em perfume e cores que gostaria de derramar no seu dia, antes que seu gosto se apague em mim. Logo a gente morre, é tão lindo morrer, tão preciso viver, tão precioso, tão flor, pão e água.
Modos subjuntivos.

quarta-feira, 27 de junho de 2012


           Eu não saberia usar das mentiras disponíveis para explicar meus conflitos, não sei jogar, não tenho grandes projetos, ando por aí, paro e desconfio do espelho, ultimamente desconfio muito do tempo, o espaço realiza poesias que dormem, comem, vertem sangue.
           O caos dança no horizonte e me pede corpo, o oxigênio é o conflito, uma guerra que não cessa, os sons fazem pares com signos tortos. Uma ideia, um suspiro, braços em comum afeto.Alegria leve, limpa, alegria de som, em sol maior. Tão bonito o quanto se ver.
          O tempo, os ponteiros mentem. A lágrima, a lâmina. Os cortes se fizeram versos. O tempo é o corpo  em angústia e alegria.Sentidos e braços abertos. Ser, livremente ser, é um tesão. 

segunda-feira, 18 de junho de 2012


                                                         NUVEM

  A mulher entra no seu apartamento com um abismo pulsando nas entranhas, com uma fome de domingo e com um cansaço já seu. Da janela o horizonte se anuncia com a vertical e funda ideia de não mais ser, o anúncio de um fim não a alegra: satisfaz, respira fundo e pede  qualquer coisa, pela consciência que o corpo precisa, não pela vontade de comer, faz um tempo que não sente fome, olha pro anel que exibe na mão direita e já não significa o sol daqueles dias  passados.
           O quarto exibe o que foi sua escolha, alguns livros não lidos, outros sujos de tanta releitura, na sala a cortina grita o vento que ela não sente, a mulher não vive no apartamento, vive  em um canto de um vazio, amarelo e triste, embora as paredes, os móveis e seu tapete, de cor tão sua, denunciem sua alma.
         Na cozinha, um pano de prato amassado, umas xícaras sujas, uma manteiga aberta e pão duro não conversam com sua vida de fora, tão sociável e rica, tão restaurantes, papos acadêmicos no final da tarde, discursos atravessados que ela reúne para um dia discordar , porque o que enxerga é feio e não condiz com o discurso.
       Encerra o domingo na janela, namorando uma nuvem, matando a sede de silêncio, exibindo a solidão para o céu. Na semana, atravessa faróis amarelos, corta fios, corta assuntos, costura bandeiras  já sem símbolos: “operária em construção”.
         Atende aos prazos, ao prazer, ao passo rápido da cidade, ao gosto da rotina, à escolha das cores das  meias.
         É domingo e a vida se repete: a liga, a língua e a linguagem vão aos poucos transformando-se  em promessa, em dívida interna, aconchego impossível de um afeto vão.
         Suco, pão, queijo, faca e fruta e a distância da cruz:  uma flor vermelha na cozinha anuncia um novo perfume, talvez uma nuvem que dure mais, que dure até a tarde cair. Que refresque o peito morno, as cinzas, o  pó, a pouca fé numa vida longa, porque o que é vida?  Diga quem souber.  

terça-feira, 12 de junho de 2012

        Uns anseios , como se de repente eu fosse explodir ou flutuar, chorar no meio de uma comédia, levar um tiro enquanto rio, matar alguém enquanto canto.
        Durmo menos nos últimos meses, bebo mais café , falo menos nas últimas semanas. Abandonei as coisas que são muito minhas, cerco as pessoas anônimas com meu olhar, cubro de dúvidas quem me encara, lanço meu corpo cansado num colo frio e distante e sinto medo de mim tanto quanto da outra.
       Sem crédito para o futuro, meu café vai amargando as datas,  excedendo os prazos.Tenho assustado os que me tem afeto com um certo silêncio nos últimos dias, sigo querendo uma transparência mentirosa, esse discurso já repetido, esses dizeres já sem carne, minha pele  vai ganhando marca, os pés sangram no cansaço e as mãos, atadas, esfriam sem espera. As unhas vão perdendo a graça dos meus esmaltes, os meus batons e perfumes não enfeitam o corpo.Aqui, alguém se perde. num mundo que fiz muro, porque a hipótese, bem sei, pode ser veneno.
Apague as luzes .

                Finalmente você voltou Maria, eu estive tão cansada todos esses dias. Eu amei tanto você, abrindo a porta, os braços, as pernas, para viver. O corpo é possível ainda sem você, mas eu quero dizer o quanto o gosto do seu corpo pode me curar do mal do mundo, sem você dei pra andar tonta, eu saio com o rosto carregado de cores, com as palavras na garganta esperando algum desatar de nós.
            Um passo falso e eu me lanço pra um bar, um barco, um voo, um salto de paraquedas, eu sou uma mulher Maria, eu não posso mentir pra imensidão dos seus olhos, negar que suas mãos me livram do inferno, me santificam a carne, alimentam, me fazem ver, respirar flor, ficar muda de tanta alegria. Quase quatro anos e ninguém sabe e nem pergunta de você. Eu dormi com pessoas incríveis, eu acordei com pessoas horríveis. Eu saí de nossa casa, porque a pia tinha lembrança de como você cozinhava, a geladeira não tinha mais seus temperos e eu sentia ainda o peso da sua mão na minha cintura antes de adormecer.
             Agora você aparece,  me tira a roupa e me ama .Nada aconteceu esses anos? Eu respondo que não, meus olhos são eternamente seus, minhas mãos são cúmplices do seu prazer, da sua rota, eu sou seu continuum , seu sim em  afeto, eu colecionei todos esses anos os  poemas que parecem com você....”enlacemos as mãos”. Eu já me inscrevi no curso de francês, quero te escrever cartas novamente, te acordar com Norah Jones só pra gente continuar na cama, eu vou aprender umas músicas da Madona pra você ficar feliz.  Eu fiz uns desenhos de uma mesa que eu quero fazer pra gente, pra gente jantar, beber e fazer amor. Vou comprar uma mesa de sinuca pra aprender a jogar e espalhar uns livros em cima, eu leio um conto e você faz um arroz, eu gosto do seu arroz.
           Nessa terça fria você invade meu quarto com suas cores escuras e tira a roupa enquanto sorri e eu  fico achando que somos deus. Como você consegue tirar de mim o peso do mundo,  aquecer o frio de mil noites estúpidas sem você? Eu não a interrogo, eu só quero seu corpo, assim como você também só se sabe em mim, porque o tempo é um senhor me explicando o quanto eu te preciso, o tempo é meu amigo, o Rilke é meu amigo, eu lhe fiz poesias Maria, eu quero ficar velha deitando no seu corpo, eu posso até transar outros sentidos, você também, o que é sacro é nosso pão, nosso fermento, nosso amor de noites inteiras santificando nossa carne, nos fazendo flor, mel, leite, sangue, letra, língua. Não há estação que mude, nada que me tira você , porque eu não deixo, te mantenho com sangue, com meus verbos mais densos, minha sintaxe mais natural, minha força sutil e meus olhos, sobretudo meus olhos, são internamente, internamente ( esse ciclo) uma dúvida, uma dívida  diante do mundo, deite comigo  Maria, eu te direi mais uma vez quem sou. Meu corpo também é seu e você sabe tão bem quanto eu. Deixemos o mundo, em paz com a vida, com vida ainda.
         Comungar seu corpo, marcar você na minha pele, jogar as tintas sobre as incertezas do mundo, sair do limbo, ser sexo, ser imensa, santa, saias, vestidos : enfim transbordar,  nossas cores juntas de novo, vamos pegar mochilas com nossos sonhos mais antigos, eu te dou minha mão e meu sim, você já pode me matar, vai ser doce, como um dia  você prometeu.

sexta-feira, 8 de junho de 2012


           Perdoe a minha mão em espera e também esse jeito torto de andar por aí. Não pense que não fiz janta todos esses dias, os  pratos na pia lhe mostrariam o quanto de espera aguentei.
         Eu parei de fumar e comprei sapatos de cores claras. Guardei seu pijama junto ao meu, caso você não volte, seu cheiro de limão com pasta de dente estará nele. Tudo que você me deu,  agora,  é um exército inimigo. Abro a porta e lá estão prontos pro ataque:  poema de Drummond com seus riscos, anéis esquecidos na minha gaveta...
            Eu finalmente arrumei lugar pro espelho, o vizinho chato mudou daqui, e nunca mais voltou...Eu lhe diria tantas coisas, eu xingaria você.
                 Sente aqui  Maria, me deixe tirar sua blusa devagar, gosto desses botões vermelhos no seu casaco.  Me deixe chegar  perto em silêncio . Deito minha cabeça no seu colo e espero sua voz silenciar minha confusão do dia, essa chuva  deixou seu cabelo molhado, suas mãos frias, os dias de  inverno esfriam você e me acendem, repouse suas mãos na minha cabeça, alcance minha dor, reconheça meu desespero durante uns minutos , eu lhe farei um chá de canela, de maçã. Encontre o pó de café, não faz tanto tempo assim você o guardava lá, perto do açúcar.
            Seus esmaltes escuros e suas mãos ainda queimam meus sonhos, então não olhe muito nos meus olhos Maria, respeite a saudade do meu corpo, só quero lhe fazer um chá e falar sobre os estudos  , os vizinhos novos , você me diz do cinema com  Malu ,da saidinha com o Zé e eu finjo não prestar atenção, a água ferveu Maria.


                                      O medo de dizer da  fundura das coisas.

                 
                  Eu não saberia dizer, onde foi mesmo que eu fiquei com esse olhar perdido, e eu nunca consigo fechar os olhos diante desse fermento todo. Os pares todos vão cerrando os dias de chuva.
                   Sentei sozinha num café e um homem largo e branco me apontou uma interrogação bonita,  que me afligiu e me entristeceu, as pessoas  me entristecem, me lançam palavras vãs...Me interrogam, são bonitas, têm vida, têm histórias, coisas especialmente suas, eu não tenho, eu vou morrendo sem saber dizer. Na faixa de pedestres conto os pares, enquanto o farol  abre, vejo homens ,vejo mulheres,  ontem vi uma mulher feliz, riu sozinha e retocou o batom enquanto o farol não abria. Uma outra mulher atravessava a faixa , segurando a mão da menininha ruiva, a menina estava feliz, a mãe não.
                    Nas ruas os contratos de felicidade vão se desfazendo, as caras de preocupação, de raiva, vão virando sono nos bancos dos ônibus, vão virando atraso, promessas pra semana que vem, aquele café no domingo,  aquele caso das antigas, aquela vontade de repente retomar o gosto de inverno. Eu sumo, normalmente, sem palavra nenhuma, gosto nenhum. Eu perdi alguma coisa, eu ganhei uma confusão, eu vejo as correntes, os contratos, as mentiras com drinques caros, a coação que o tesão pressupõe, o medo de dizer da  fundura das coisas , repouso o olhar no caos e me lanço em desafio para enfrentar a rotina, a mancha no vidro, os pratos na pia, as cartas já amarelas não mentem mais. O dinheiro, as passagens, as roupas, os livros, o espaço, a tinta, o pão, o leite, todos esses são calculados, creditados, pagos, ralos, e a doçura perdeu o rumo, vou ficando feia. Abandonei o olhar num ponto de interrogação eterno.
                 Cada dia um susto, uma nova cor, uma violência, um dia de distância, corpos que não se encontram, copos sempre cheios, poesias  nos perfumes de tantas moças que passam, as palavras-laços enfeitando as noites de música, de  cintos, cinturas, zíper, café puro, energético, eu,  só,  vejo. Sem par. Há uma raiva de certas coisas não ditas, há vontade de força, de corpo, de sangue, de unha, abraço,  cansaço, beijo e sangue, poesia e sexo, as correntes são aço, aço, aço. Um dia serei vítima de um grande afeto sem aço, sem corrente, os corpos se encontrarão, o que  no  fundo é mentira. Pena.

sábado, 2 de junho de 2012

A fila do pão, a buzina na calçada, sua nuca ao abrir os olhos e seu corpo precipitando o dia....
O gosto da eternidade na sua língua, como o primeiro raio antes da chuva.
Seu abraço branco precipitando o fim.
Eu te traí . Eu tive medo do seu gosto.A eternidade é pequena pra eu entender porque sua língua  limpa minhas pequenas alegrias. Minhas ameaças são anônimos e fúteis.
Todas são você e não são você: ?

sexta-feira, 1 de junho de 2012


Uma mulher sobe a rua. Uma mulher arde de ciúme enquanto passa o esmalte vermelho.
Uma mulher entra no bar. Uma mulher compra lingerie.
Ela pede vodca. Ela pede cama.
Elas ardem, sem lingeries, sem ciúmes, ardem.
São mulheres, são lindas!
Uma mulher se pinta. Uma mulher se esquece.
Uma mulher tem relógio.  Uma mulher tem batom.
Ela quer  resposta. Ela quer café.
Elas podem o mundo.
Elas foram longe, onde os sentidos trazem Deus.